domingo, 19 de abril de 2009

A Câmara Viajante

Que pode a câmara fotográfica?
Não pode nada.
Conta só o que viu.
Não pode mudar o que viu.
Não tem responsabilidade no que viu.

A câmara, entretanto,
Ajuda a ver e rever, a multi-ver
O real, nu, cru, triste, sujo.
Desvenda, espalha, universaliza.
A imagem que ela captou e distribui.
Obriga a sentir,
A, criticamente, julgar,
A querer bem ou a protestar,
A desejar mudança.

A câmara hoje passeia contigo pela Mata Atlântica.
No que resta - ainda esplendor - da Mata Atlãntica
Apesar do declínio histórico, do massacre
De formas latejantes de viço e beleza.
Mostra o que ficou e amanhã - quem sabe? - acabará
Na infinita desolação da terra assassinada.
E pergunta: "Podemos deixar
Que uma faixa imensa do Brasil se esterilize,
Vire deserto, ossuário, tumba da natureza?"

Este livro-câmara é anseio de salvar
O que ainda pode ser salvo,
O que precisa ser salvo
Sem esperar pelo ano 2 mil.

(Carlos Drummond de Andrade)

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