Cotidiana 1
A vida cotidiana é um instante
De outro instante que é a vida total do homem
Mas por sua vez quantos instantes não há de ter
Esse instante do instante maior
Cada folha verde se move ao sol
Como se perdurar fosse seu inefável destino
Cada pardal avança a saltos imprevistos
Como burlando-se do tempo e do espaço
Cada homem se abraça a alguma mulher
Como se assim agarrasse a eternidade
E contudo cada instante
Ou seja cada partícula de pó
É também um copioso universo
Com crepúsculos e catedrais e campos de cultivo
E multidões e cópulas e desembarques
E bêbados e mártires e colinas
E vale a pena qualquer sacrifício
Para que esse abrir e fechar de olhos
Abarque por fim o instante universo
Com um olhar que não se envergonhe
De sua reveladora
Efêmera
Insubstituível
Luz
Tática e estratégia
Minha tática é
Olhar-te
Aprender como és
Querer-te como és
Minha tática é
Falar-te
E escutar-te
Construir com palavras
Uma ponte indestrutível
Minha tática é
Ficar em tua lembrança
Não sei como nem sei
Com que pretexto
Mas ficar-me em vós
Minha tática é
Ser franco
E saber que és franca
E que não nos vendamos
Simulacros
Para que entre os dois
Com que pretexto
Por fim me necessites
Em pé
Continuo em pé
Por pulsar
Por costume
Por não abrir a janela decisiva
E olhar de uma vez a insolente
Morte
Essa mansa dona da espera
Continuo em pé
Por preguiça nas despedidas
No fechamento e demolição
Da memória
Onde cair
Morto
Currículo
A história é muito simples
Você nasce
Contempla atribulado
O vermelho azul do céu
O pássaro que emigra
O primitivo besouro
Que seu sapato esmagará
Valente
Você sofre
Reclama por comida
E por costume
Por obrigação
Você aprende
E usa o aprendido
Para tornar-se lentamente sábio
Para saber que no fim o mundo é isto
Em seu melhor momento uma nostalgia
Em seu pior momento um desamparo
E sempre e sempre
Uma confusão
Então
Você morre
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